quarta-feira, 1 de agosto de 2012

A Castração e a pulsão de morte na infância e a obra fotográfica de Mokhorev. .

A fotografia é uma das expressões artísticas que, assim como o cinema, sofreu grandes transformações nos últimos vinte anos, passando a apresentar uma forma tão distinta daquela que possuia no fim do século XX que não se pode dizer que se trata da mesma forma de se expressar artisticamente. A fotografia e o cinema tornaram-se arte de domínio coletivo e isto se "revela", para usarmos um termo aplicável às duas formas de arte que maior paixão vem despertando nestes dias de hiper modernidade, de forma desconstrutora, esmagadora e uniformizadora, onde tanto o instante congelado quanto a câmara lenta, revelam e não mais ocultam, como faziam antes, a angústia que nos causam a efemeridade e a futilidade de nossos instantes.
Nossas vidas não são mais para serem vividas na dolência compassada dos tempos idos, onde a morte era somente uma passagem da existencia e não o espetáculo midiático que vemos hoje, e a vida era composta de longos períodos de convívio. A infância, enquanto período protegido das amarguras humanas se prolongava até aos 17-18 anos, mesmo para o menino que trabalhava desde cedo no campo onde a dureza e a rudeza dos dias consumiam a carne e a sensibilidade da alma se esvaía como areia entre os dedos.
A fotografia de Mokhorev desnuda diante dos nossos olhos uma infância em branco e preto, sem as cores que seriam apropriadas para os sorrisos de meninos e meninas. Mas em sua arte, principalmente nas fotos capturadas na Moscou pós muro de Berlin,  a infancia não sorrí pois já não existe. E esta des-infancia não é só dos meninos russos mas também das crianças brasileiras.
   No Brasil pós Lula temos duas infâncias que negam a sí mesmas a identidade de infante no sentido plástico e idílico daquela criança que tinha tempo para pular corda e amarelinha, rir alto e não ter medo de peguntar ao mundo adulto o que é isso ou aquilo. A infância da classe média alta que paga escola particular com plano de saúde e transporte com ar-condicionado e monitor e a des-infância dos meninos e meninas da baixa classe média das periferias que frequentam escolas particulares com professores que no outro período de trabalho atuam na escola pública e por fazerem dupla jornada de trabalho não podem acompanhar a desconstrução da informação a qual seus alunos, tanto os da escola pública (mesmo com menor possibilidade) quanto os da escola particular da periferia, se defrontam, constroem, elaboram, consomem e são consumidos em celulares, Iphones, mini-tablets e páginas de convívio social cada vez mais plástico, asséptico e por isso mesmo violento, preconceituoso e consequentemente fútil e idiota. 
   É neste sentido que a pulsão de morte se desloca do rompimento do cordão umbilical, da perda do conforto uterino para a execração pública, o bulling, a homofobia, a xenofobia e ao fim, a morte pura e simples, seja ela real ou virtual. A morte virtual não sangra (coisa que decepciona o consumidor voraz pelo líquido pastoso vermelho que jorra da jugular do outro (basta ver as partidas de futebol infantil assim como os do campeonato televisionado) -desde já chamo a atenção para o sucesso dos vampiros, monstros e duendes que sugam vidas, mesmo que de forma romantica em tons pasteis em filmes, fotos (estas aos milhares nos Facebook's) e perfís que nem sempre são aquilo que seus teens representantes dizem ser) ao contrário da morte real que choca e faz vender mercadorias e aplicativos.
A fotografia de Mokhorev e a filosofia psicanalítica de Freud de certa forma se intercalam para responder às nossas angústias dinte do inesplicável mundo em que vivem nossas crianças. Um mundo onde o adulto é o bobo da corte que diverte por sua completa idiotice e estupidez. 
    Tanto professores das escolas particulares quanto das escolas públicas das períferias enfrentam a mesma angústia diante do uso abusivo da tecnologia por seus alunos em sala de aula. Não sabemos mais o que fazer para dividir a atenção (ou conviver com a falta dela) com celulares das centenas de modelos diferentes- algúns inclusive lembram brinquedos) e de forma produtiva restabelecer o convívio em sala de aula.
  Imagem: fotografia de E.Mokholev. Fonte: http://revistafotomania.com.br/blog/item/406-evgeny-mokhorev-a-grande-revela%C3%A7%C3%A3o-russa-da-fotografia

  

quarta-feira, 11 de julho de 2012

A fotografia.

Minhas mãos construiram esse país
minhas pequenas maos quando ainda não sabiam
segurar o lapis
já capinavam o capim
já trocavam o parafuso da roda
do capital do mundo.
Imagem: Dorothea Lange.Fonte: https://readreidread.wordpress.com/2011/05/26/happy-birthday-dorothea-lange/

sábado, 23 de junho de 2012

através das estrelas

caminho pelo céu
em pêlo com os pés
nas nuvens de cabeça.
Vejo você junto ao Criador.

Imagem: Leite milk de Anne Wardrope Brigman. Fonte:http://pinkneptune.milkboys.org/

sexta-feira, 22 de junho de 2012

não aguento mais

não suporto mais o cinismo
de seu sorriso cínico
esse seu jeito de quem
é amigo de Deus.

Imagem: Evgeny Mokhorev, Pistol, Fotógrafo russo que retrata a infância na Russia.
Fonte: http://nicethingsatkajsaanddittes.blogspot.com.br/2011/03/evgeny-mokhorev.html







TUDO DO LADO ESQUERDO

o lago está do lado esquerdo do
peito do lado esquerdo está o 
coração está do lado esquerdo
do peito tem o mamilo do lado direito
do lado esquerdo

Imagem: Kevin Carter, O símbolo da fome e do horror em África. Suan,Sudão, Março 1993. The New York Times. Fonte: http://bitaites.org/artamente/as-varias-mortes-de-kevin-carter/

terça-feira, 12 de junho de 2012

a dor aplacada

traga até minha boca o vaso de veneno que tens em teu coração
talvez assim aplaques a dor que sinto no peito
o fogo que queima minha alma
a solidão da madrugada insone solitária

traga té minha boca o veneno que tens em teus lábios
talvez assim eu morra depressa sem ver a lepra que tens em seu coração
talvez assim consiga sobreviver ao ódio que me dedicas desde o dia que me conheceu
e os amantes enlaçados entre os lençóis talvez
morram de tédio antes do amanhecer
sossegando assim a tempestade e aplacando a ventania
permitindo que as flores à beira do caminho
mostrem-se menos frágeis ao sol da manhã.

Foto: Julie Blackmon. Superman. Fonte: http://www.julieblackmon.com/

É DE MINHA PENA

é de minha pena apenas a pena
são de meus sonhos apenas aqueles
que não se realizam é de minha
é de minha poesia somente
a cinza do morto jogada
n'água dos teus pesadelos

não é poesia o que faço mas somente sementes que jogo aos cães
é veneno que destilo pelos meus dedos somente veneno
nada que alimente sairá de meus lábios não espere que o tempo melhore
as nuvens escurecem e dos teus olhos somente se verá lágrimas tristes
não espere que eu componha um verso que fale de amor
não espere que eu escreva uma carta ao senador e que tudo mude de repente
o mar vai secar e não há nada que eu possa fazer
as estrelas vão cair e não há nada que deus nenhum possa mudar
o destino está traçado e as desgraças que teriam de acontecer pela eternidade
virão todas de uma só vez nesta sua vida desgraçada
não é poesia o que faço mas somente sementes que jogo para as aves de rapina

não é remédio o que trago nos frascos que carrego na alma
é veneno que recomendo que tomes para curar a tristeza do teu riso
não é alegria que estampa minha cara de idiota
não são sinceros os meus votos de felicidade
não é verdade que te amo
meu coração é de pedra pura não cabe nele nenhum tipo de sentimento que mereça
ser descrito em palavras somente as lágrimas das dores dos partos das mães mortas
somente o cheiro de perfume estranho que exala do corpo da prostituta morta
como menino triste que canta canções tristes de botequins são meus poemas
uma prostituta ensinou-me o que é o amor
por isso tenho esse olhar de peixe que morreu
por isso meus amores nunca foram descritos por poetas
por isso minha alma abandonou meu corpo a muito tempo

Não são poemas o que canto
são só frases soltas sem nenhum sentido
por isso homem de negócio nenhum perderá tempo aqui lendo minhas tristezas
vá embora você que veio até aqui e não se esqueça
vomite antes de chegar em casa.

Foto: Martin Munkacsi. Boys running in to the surf a Lake Tanganyika, 1931. Fonte: http://weimarart.blogspot.com.br/2011/06/oh-boys.html